segunda-feira, fevereiro 09, 2009

Intronizado na alma a marteladas


Alma (1986)
Egberto Gismonti

Lembrei-me ontem do impacto exercido sobre a minha alma pelo álbum homônimo que o multiinstrumentista fluminense Egberto Gismonti entregou ao mundo em meados dos anos 80. Eu tinha 14 anos, comprei o LP sem saber direito o que ia encontrar. Mas o efeito foi estrondoso, desde o primeiro acorde - um rotundo ré bemol martelado no piano sob a fúria de Baião Malandro, faixa de abertura do álbum, uma das minhas faixas preferidas e uma das mais famosas do compositor.

Eu nunca tinha ouvido nada daquela natureza no piano e, confesso, este instrumento nem era o que mais me movia o espírito - lembrem-se que sou violonista desde o berço. Mas a interpretação às vezes exagerada, às vezes enigmática desse compositor filho de árabe e italiana fez-me ouvir o som do piano e a música instrumental de forma diferente. Havia ali um pouco de cada influência visível no músico: a grandiloquência das harmonias italianas; as intempéries provocativas das escalas mouras; o uso de clichês melódicos do cancioneiro popular brasileiro; e um visual cigano peregrino, situado em algum sítio entre Cádis e a costa Amalfitana.

Virei fã desse músico hermético, virtuoso e recorrente - minha maior crítica é sua repetição desenfreada de composições em seus álbuns. Comprei os títulos que encontrei, driblando a dificuldade de serem quase todos editados por um selo europeu alternativo que vendia seus discos no Brasil a preços proibitivos. O advento da pirataria semi-consentida dos mp3 permitiu-me completar a coleção de mais de 45 álbuns próprios.

Náo tenho a pretensão nem o intuito de convercer ninguém a gostar do Egberto da mesma forma que eu. Mas se você só tiver disposição para ouvir um álbum dele, ouça Alma e não se arrependerá. E se só quiser investir 10 minutos com este estranho músico, ouça Palhaço e 7 Anéis. Isso pode mudar a sua vida.

9 comentários:

Plinio Bolognani disse...

Sensacional mesmo...

gostei mais dele tocando "sete anéis".

Alias, você viu aquele garotinho de 8 anos que é autodidata (não sei se é assim na nova regra) no piano?

Plinio Bolognani disse...

http://www.youtube.com/watch?v=MnTKaFPxyo0&feature=related

ai um video dele...

Silvinha disse...

adorei a idéia da apreciação musical. vamos socializar esse talento aí, véio...

mélis disse...

Incrível ter amigos tão inteligentes! incrível esse jeito de descrever musicos e música.
Acho lindo quem consegue enxergar tudo isso.
Como leiga em música instrumental que sou, só posso dizer que senti a respiração mudando junto com os acordes (?) em Sete Anéis. Amei. (this is as far as I go in musical apreciation. sorry.)

Thanks Jackety.
ah..meio 'ô lá em casa' essa mistura ítalo-árabe-gipsy.
pensei.

giacca, synbad, tchuca... disse...

acho foda esses molequinhos autodidatas* de musica... talvez pq eu tenha comecado a estudar cedo e lembro de as pessoas acharem raro alguem tocar tao novo... mas eu estudei e nao tinha com 6 anos esse grau de qualidade no que eu tocava... q foda!

(* = nao se usa mais hifen quando o prefixo termina com vogal e a segunda palavra comeca com consoante diferente de r e s)

giacca, synbad, tchuca... disse...

sil, melis, valeu pelos elogios... vamos ver se eu consigo pelo menos dividir esse lado musical com as pessoas (ja q tocando eu to um fiasco ultimamente)

melis, vc achou o Egberty um "o, la em casa"? vc realmente gosta de talento e inteligencia, nao de beleza...rsrs, pensei

mélis disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
mélis disse...

exato! exato! exaaato! beauty is in the eye of the beholder

mélis disse...

exato! exato! exaaato! beauty is in the eye of the beholder