sexta-feira, dezembro 12, 2008

Lembrei da velha

Nestes últimos dias lembrei algumas vezes da minha avó materna, a vó Rosa, como costumávamos chamá-la.

Ela nasceu no navio que trouxe minha bisavó da Itália, em remessa distinta daquela de meu avô. Foi parar num orfanato, aprendeu a ler bem cedo e sozinha, por teimosia e ironia de um destino que não lhe punha medo.

Pariu pela primeira vez aos 16 anos e teve 6 filhos num intervalo de uns 30 anos. Por isso, meu tio Líbero, o único homem dentre a prole, era mais velho que minha mãe, a caçula, a ponto de lhe ter servido de irmão e às vezes pai, substituindo o verdadeiro que morreu quando minha mãe era menina.

Lembrei de frases que minha vó não cansava de repetir (até porque acho que não percebia que vivia repetindo):

- "Gavião que pega o pinto, pega o galo, que eu quero ver! O pinto não sabe nada, mas o galo dá o que fazer..." - esta ela cantava, sempre que via alguém abusar da vantagem física.

- "O mangiare questa minestra, o saltare dalla finestra", empregada quando alguém demonstrava qualquer tipo de frescura.

Mas a história campeã de audiência era um diálogo entre mim e ela, de quando eu tinha uns 8 anos, que foi motivo de alegria pra minha avó até o fim da sua (longa) vida.

- Vó, uma pessoa pode viver 120 anos?
- Ah, Marcinho, é difícil, mas pode...
- Então, a senhora vai...

Ela quase foi. Mas cansou antes, aos 103.

3 comentários:

Silvinha disse...

maaaaaaaaaarcio! isso não se faz!
esmaga meu coração logo cedo...

mélis disse...

Esse tipo especifico de vó é um coisa fofa, né? uma 'benção' (pra usar uma expressão bem de vó)
E o texto tá escrito de um jeito tão bonito! vcs são todos uns redatores! ai,ai,ai!

Silvinha disse...

voltei aqui pra lavar minha alma... esse post tá lindo demais.
não sei se a Hannah Arendt comentou isso, mas ler também ajuda a gente. é uma beleza...