quarta-feira, setembro 29, 2010

Ziraldo, telegrama para você

Como a maior parte das pessoas da minha idade, conheci o Ziraldo através do livro "O menino maluquinho". Na época, adorei o livro, mais pelas ilustrações que pelo texto (que já achava um pouco bobo, mesmo sendo criança).

Apesar do impacto daquela obra, não li nenhuma outra criação do autor, por absoluto desinteresse. A participação dele no Pasquim, que poderia ter-me interessado, já havia caído no esquecimento quando virei gente grande. Foi assim que o Ziraldo virou apenas um escritor-cartunista polêmico e tão maluquinho quanto seu personagem mais famoso.

Ao longo dos anos, fui colecionando observações da esquisitice do artista. Marcas comuns sempre foram a defesa incansável da leitura desde o ensino fundamental (bandeira muito louvável, por sinal) e a total apologia contra as novas (e até as já antigas) tecnologias (esforço inútil e equivocado, ao meu ver. Resistência, eu entendo; aversão, até aceito. Mas apologia contra, acho lamentável.)

Exemplo da primeira mania ziraldista: sempre fez palestras, entrevistas e declarações públicas de incentivo à leitura (não apenas de seus livros, mas geral) e elogiou o trabalho dos professores, cuja missão primeira, segundo o autor, é a alfabetização, acompanhada do despertar do desejo pela leitura. "Ler deve ser igual a comer, beber e respirar", argumenta recorrentemente o pai do Menino Maluquinho.

Com relação ao repúdio às tecnologias, também são repetitivos os exemplos: "só uso máquina de escrever, não gosto do computador"; "não acredito que o e-book vá substituir o livro em papel, o livro é insubstituível"; afirmava reiteradamente o escritor, sem preocupação em ser polêmico.

Lembro inclusive de entrevista memorável ao Roda Viva, da TV Cultura, em que o Ziraldo discutia com um jornalista jovem do Estadão sobre o e-book. Todo argumento do artista a favor da versão em papel (por exemplo, a vontade de fazer anotações no livro, o gosto por ler ao sol, o apego à maleabilidade do volume) eram refutados pelo jornalista prontamente (respectivamente, é possível inserir comentários no livro eletrônico, a tela pode ser antirreflexiva, os e-readers serão dobráveis como o papel). Como não queria perder, Ziraldo apelou (e ganhou): "mas e se eu estiver lendo no banheiro e faltar papel, o e-book me atende?"

Embora sempre questionável e intransigente, o Ziraldo era razoável. Mas agora, vendo suas últimas afirmações, parece-me, que ele está se excedendo. Em outras palavras, ficou gagá, ou perdeu de vez a paciência com a opinião dos outros e só quer saber mesmo das suas crenças (ainda que sem bons argumentos para sustentá-las).

Recentemente, Ziraldo mandou as seguintes pérolas:
A internet é o antro do débil mental. Só tem idiota na internet. (...) A linguagem cifrada é para imbecil! (Confira aqui)
A internet é nova (...) e o ser humano ainda não sacou o que fazer com isso (...). A maior utilidade é a pesquisa (...). Se eu quiser saber como é a bandeira da Dinamarca, eu entro no google (...) O convívio do ser humano com a internet está criando um ser muito próximo do imbecil (...), dificilmente você vê uma pessoa brilhante nessa merda (sic). Eu acho o internauta um babaca.  (Confira aqui)
Ler é mais importante do que estudar (...) porque se a pessoa não souber ler não tem como estudar...  (Confira aqui, no finalzinho)
Esses exemplos mostram que de fato o personagem tomou conta do criador e, infelizmente, o bom velhinho esclerosou de vez, ou recebe a visita daquele alemão (o Alzimer), ou ambos. O importante é que a internet está aí, quase sem utilidade, sem aplicação prática na vida das pessoas, mas firme e forte, ainda que gerando a dúvida na mente dos indivíduos: "o que fazer com esta invenção quase inútil e imbecilizante?".

Eu até entendo que a gente fique cansado com tantas novidades e não acho que devamos necessariamente aprender e nos tormarmos experts no uso de qualquer tecnologia. Pessoas envelhecem e merecem descanso e compreensão. Mas também não acho preciso esculhambar aquilo que não conseguimos compreender. Bastaria dizer: "acho bom ver a evolução do homem, mas já não me envolvo, nem me empolgo, com as invenções tecnológicas recentes". Custaria dizer isso? Que menino maloquinho, não?

De qualquer forma, para quem quiser ignorar a opinião pessoal do autor e optar por investir na leitura de seus livros novos, basta comprar o e-book, já disponível (por exemplo, através deste link). Afinal, o autor pode ficado maluquinho, mas a Editora Melhoramentos, não.

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